"...aprendi que aprender é conscientizar-se e que o desenvolvimento de nossa consciência social é o acréscimo de esperanças angustiantes, que o prazer do aprendizado se mescla com a dureza de uma realidade social triste e desesperada que se incorpora e constroi a consciência do mundo e da vida..." ( Ex-Senador Lauro Campos)

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Religião e Politica no seculo XXI ?! Como separar rumo a construção de um Projeto de sociedade?

Texto do Prof. 
Jean-François Deluchey - Universidade Federal do Para.

Será que podemos resistir à mistura da religião com política no XXI século? André Malraux, ministro francês da Cultura e literato autor do romance maravilhoso "A condição humana" fez a seguinte advertência ainda no século passado: "O século XXI será religioso e não será!" Quando vejo a religião dar um sentido dogmático ao engajamento político, isto me preocupa. Não que estejamos completamente desprovidos de valores religiosos na nossa construção cultural coletiva, seria idiota sustentar tal afirmação. O que me preocupa é quando todos os projetos políticos se referenciam em assuntos religiosos, seja positivamente ou negativamente. Eu fui criado com um pai ateu e uma mãe católica, mas fui criado em um ambiente onde religião fazia parte do universo privado (a famosa laicidade à francesa). E tenho respeito demais para a fé para não considerar que isto possa ser importante para um indivíduo, que isto constrói e molda o espaço íntimo de qualquer um. Cada um tem a sua própria fé, até um agnóstico como eu. O que me preocupa é quando esse espaço íntimo, essa crença ou essa fé se torna a única maneira de se colocar como cidadão na esfera pública. Não se pode mais ser católico e socialista, muçulmano e liberal, homossexual e protestante, espírita e anarquista? O foro íntimo como berço da ação política apenas pode levar à intolerância, ao fascismo de toda espécie. Creiamos, tenhamos fé, porque isto nos sustenta perante à grande pergunta. Mas pelo amor de deus (!), deixemos de tomar a bíblia, o corã ou outra referência religiosa como se fosse nossa constituição política, o projeto que pode unir nós todos. Apesar de sua raiz latina, a religião mais divide de que une, porque ela não propõe o debate, ela impõe um dogma, uma visão particular e definitiva (portanto não discutível) de nosso ser coletivo. Dogma é contrário ao pensar. E se quisermos construir um projeto renovado de sociedade, que possa nos unir na mesma fé do amanhã. Temos de pensar e reunir esses pensamentos através da confrontação dos pensamentos. Vejo muitos amigos, colegas e estudantes que confiam cada vez mais na religião para construir um outro amanhã, e um outro "eu". A vida espiritual não é um projeto político, é uma vivência íntima. Essa vivência íntima pode lhe oferecer um caminho de vida particular, é obvio. Mas nunca deixará de ser uma experiência íntima e nunca deve deixar de ser. A solidariedade é possível de expressar através da fé cristã, da fé muçulmana, da fé espírita ou de outra fé, claro que sim. Mas uma idéia política supera, em termos coletivos, todas as doutrinas particulares ao foro íntimo. Alguns querem fazer da religião uma negação da política. Eu digo para os meus amigos que confundem fé religiosa e caminhada política: usem os valores religiosos para o bem coletivo, mas não se prendem a elas como vetores de exclusão. O que aconteceu recentemente no meu País, a França, é paradigmático do que eu queria expressar aqui, com palavras pobres e desajeitadas de forasteiro. A religião (às vezes até concretamente, através do financiamento pela Igreja dessas manifestações do "contra a igualdade de direitos para todos"), não pode ser a chave de entendimento do nosso viver comum, do nosso projeto coletivo. Ela pode nutri-lo, mas nunca substituí-lo. Por isso minha oração (!): que sejamos capazes, apesar das nossas diferenças de foro íntimo, de fé, de conversar e debater do nosso projeto comum, na indiferença absoluta das diferenças. Aí poderemos, sim, enfrentar a partir do pensar, os valores que queremos defender em comum, e construir juntos o projeto de amanhã.

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